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Nacional

Lixo em Lisboa aumenta no verão: turistas desleixados ou falta de meios de limpeza?

O problema está à vista de todos. Em alguns bairros da cidade de Lisboa, o lixo acumula-se nos passeios e em volta dos caixotes do lixo. Moradores e juntas apontam culpas. A Câmara reconhece "constrangimentos ao serviço de remoção"

Há sacos encostados a contentores já maltratados, restos de bebidas em copos caídos pelo chão, garrafas de vidro em cima de parquímetros, sofás esquecidos na via e mau cheiro, sobretudo para quem passa no Bairro Alto, em Alfama ou no Cais do Sodré. É terça-feira, até já foi feita a recolha de lixo de manhã, mas o cenário que se encontra em várias ruas da cidade de Lisboa é de lixo amontoado.

Senhorinha Andrade estava a entrar em casa e reclamava com dois rapazes, turistas, que iam a sair do prédio onde vive. Parou para falar sobre o lixo que se acumula na Rua da Atalaia, no Bairro Alto (freguesia da Misericórdia), onde vive há 50 anos: “É a maior porcaria que há aí.”

Tem 80 anos, e todos os dias, quando sai de casa, vê que os caixotes espalhados pelas ruas do Bairro Alto estão cheios e, por isso, o lixo é colocado na rua, ocupando as vias. Senhorinha Andrade acredita que a culpa é dos estabelecimentos de alojamento local e restauração, que não respeitam as regras ou horários de recolha do lixo.

“[Os turistas e os funcionários dos restaurantes] têm ali os caixotes, mas não vão pôr lá o lixo. Vão pôr à porta, é aqui ou acolá”, descreve. “Há montes e montes de lixo, quase dá pelos pés” durante a manhã, descreve. E apesar de reconhecer os esforços dos funcionários da autarquia responsáveis pela recolha, afirma que não chega e deixa mais uma queixa: “Agora já nem lavam as ruas, não lavam porque não há pessoal para lavar. É um fedor que não se pode.”

Lisboa vai ser a Capital Verde Europeia em 2020, mas ainda não encontrou solução para a acumulação de lixo nas ruas da cidade, que afeta, sobretudo, o Bairro Alto, Cais do Sodré, centro histórico e Alfama. Os lisboetas queixam-se de lixo no meio das ruas e da falta de limpeza do pavimento. Apontam o dedo ao aumento do turismo, que consideram descontrolado, e à restauração. Os presidentes das juntas de freguesia juntam-se ao coro e admitem que os serviços de recolha de lixo da Câmara Municipal são insuficientes, principalmente em agosto.

Na Rua do Diário de Notícias, Júlio da Silva, que trabalha há oito anos numa loja de conveniência, conta a mesma história da vizinha: “tem havido bastante acumulação” de lixo nas ruas do Bairro Alto e refere que o sistema de recolha implementado – o Bairro Alto é uma das zonas da cidade que mais recolhas diárias tem – só funciona durante o inverno. “No verão não funciona porque é muita gente, é muito lixo”, acrescentando a tudo isso uma “falta de civismo”.

“Não se fazem limpezas porque não há gente, foi tudo de férias”, diz, apontando para os contentores cheios e para a “gordura que fica no chão”.

Maria Gabriela Vaz, dona de um café, aponta o dedo à falta de preparação das juntas de freguesia quando se viram a mãos com o aumento dos turistas na capital: “O turismo veio e nunca houve uma solução para isto”, explicou, elencando que pelas ruas “é um cheiro a urina que tresanda”. Em qualquer dia, a qualquer hora, sublinha. “No Bairro Alto é tudo crítico, a qualquer hora”, uma vez que o lixo se “acumula de dia para dia”.

Lixo é demasiado para as recolhas

A presidente da Junta de Freguesia da Misericórdia, Carla Madeira, reconhece que “nesta altura do ano existe uma produção muito maior [de lixo] do que no resto do ano” e “mesmo que os serviços [de recolha de lixo] da Câmara não estejam a ter problemas, a produção de lixo é tanta que a recolha não consegue acompanhar as necessidades que existem”.

“É essencial haver um aumento no número de recolhas”, vincou, porque “neste momento toda a freguesia se tornou numa zona turística” e, por isso, é “fundamental haver recolha todos os dias, de segunda-feira a domingo”.

“A produção de lixo tem aumentado muito e não é devido ao número de moradores”, explicou, elencando que “os moradores sabem que só existe recolha à noite e que não existe recolha ao domingo”, por isso, “acondicionam o lixo em casa ao domingo e à segunda-feira”, mas os “alojamentos locais não, colocam o lixo a qualquer hora, até porque grande parte dos check-out são ao domingo”.

“Os alojamentos locais são limpos e o lixo vem para a rua”, lamenta Carla Madeira, sublinhado que é necessário que “os estabelecimentos comerciais adaptem a sua atividade comercial à recolha de lixo que existe na zona” e que as multas devem ser “para todo o tipo de estabelecimentos”.

“Precisamos de mais meios humanos e instrumentos mecânicos”

O cenário é semelhante em Alfama. Há caixas de cartão, pedaços de móveis e sacos do lixo amontoados no meio das ruas ou nas esquinas e que dificultam a passagem de peões. Fernanda Pereira, de 62 anos, nasceu em Alfama e não tem dúvidas de que “agora há mais lixo do que antigamente” e que volta a ficar aglomerado pouco depois das recolhas. “A qualquer hora [os turistas] colocam lixo à porta, não se ralam”, vinca.

Na Rua de São João da Praça, pelas 12:30, um camião de recolha de lixo da Junta de Freguesia de Santa Maria Maior passa para recolher lixo deixado nas ruas, mas vai embora deixando um amontoado de caixas de cartão e sacos numa esquina. O veículo já não tem capacidade para recolher mais durante aquele turno. Este é um cenário que se repete, segundo os moradores.

O presidente da Junta de Freguesia de Santa Maria Maior, Miguel Coelho, reconhece que “há um maior afluxo de visitantes, quer nacionais, quer estrangeiros” e que “isso tem uma influência muito grande” na produção de lixo na freguesia. “Temos cerca de 14 mil habitantes e temos visitantes diários na ordem das 250 mil pessoas”, explica.

“Precisamos de mais meios humanos e instrumentos mecânicos e para isso precisamos de meios financeiros”, reflete o presidente da Junta de Santa Maria Maior, uma das mais afetadas pela acumulação de lixo nas ruas, que vê “com grande expectativa” o anúncio feito pelo presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Fernando Medina (PS), de que vai ser feito “um acordo com as juntas, para começarem a receber uma componente da taxa turística” que vai ser utilizada na higiene urbana.

A notícia foi avançada pelo DN, em 8 de julho: a Câmara de Lisboa vai destinar cinco milhões de euros da taxa turística cobrada pelas dormidas na cidade à limpeza urbana das freguesias da capital mais afetadas pela pressão turística. As juntas de freguesia de Santa Maria Maior, Misericórdia e Santo António vão arrecadar quase metade do valor total – 2,3 milhões de euros. Já a Junta de Santa Maria Maior, que gere zonas como a Baixa, a Sé, o Castelo de São Jorge ou Alfama, leva uma fatia de 1,3 milhões.

De acordo com o relatório que sustenta a atribuição destas verbas, elaborado pelos serviços da autarquia e ao qual o DN teve acesso, depois de Santa Maria Maior (que recebe 27% do valor total) surge a Misericórdia, com 564 mil euros (11,2%), seguidas por Santo António (435 mil euros) e Arroios (330 mil). Há quatro freguesias que, para já, não são contempladas com qualquer verba: Santa Clara, Benfica, Carnide e Marvila. O documento camarário conclui que não há pressão turística que justifique um aumento do investimento financeiro.

Mais de um mês depois, ainda nada chegou às juntas de freguesia. Mas o verão veio em força e os turistas também. “Estamos à espera que se concretize”, vinca Miguel Coelho, presidente da Junta de Santa Maria Maior, que apanha os bairros de Alfama, Baixa, Chiado, Castelo e Mouraria.

Numa nota enviada ao DN, a Câmara Municipal de Lisboa afirma que a proposta “deverá ser aprovada este ano, em reunião de Câmara e Assembleia Municipal”, e que deverá passar para as juntas de freguesia “a partir do próximo ano”. O município da capital refere também que”a limpeza [das ruas] é da responsabilidade das juntas e que, por isso, só elas podem falar da redução dos trabalhadores dedicados a essa competência”. Quanto à autarquia, “não teve redução de trabalhadores na competência de remoção” e apenas tem “mais trabalhadores em férias”, admitindo que “isso cria constrangimentos ao serviço de remoção”.

A Câmara de Lisboa deixa, contudo, a ressalva de que “a zona histórica é a menos afetada na remoção” de lixo e que, depois transferidas as verbas da taxa turística, “caberá às juntas de freguesia fazer o reforço das suas equipas de limpeza”.

Opinião diferente tem o presidente da Junta de Freguesia de Santo António (que se estende entre a Baixa da cidade e o Marquês de Pombal), Vasco Morgado, refere que “as regras do lixo não são respeitadas por ninguém”, mas não considera que haja “excesso de lixo” durante a semana.”De domingo para segunda-feira acontece [a acumulação] porque não há recolha”. Vasco Morgado lembrou que “há dois tipos de resposta” na recolha do lixo: a recolha dos caixotes pele autarquia e a lavagem das ruas e que é competências das juntas de freguesia.

Acaba, contudo, por contradizer a opinião inicial e admitir a carência na recolha da cidade: “Não há recolha eficaz em Lisboa, mas não é culpa da Câmara de Lisboa, é porque não há dinheiro suficiente para combater este flagelo e porque há um dia de paragem”, considera, elencando que a capital portuguesa “não devia ter paragens na recolha do lixo” e também que “existe falta de meios humanos numa altura que é de férias”.

As diferentes formas de recolha de lixo praticadas em Lisboa

De acordo com a página oficial do município da capital, existem três “sistemas de recolha seletiva para os materiais recicláveis, de acordo com a morfologia urbana, tipologias do edificado e características funcionais de cada área da cidade”: recolha por ecopontos e vidrões, por ecoilhas e porta a porta.

A recolha de resíduos urbanos através de ecopontos e vidrões funciona com estações espalhadas pela cidade, “é o sistema mais antigo de recolha seletiva do município”, mas tem “vindo a ser substituído pela recolha seletiva porta a porta”, segundo a informação camarária disponível. A recolha por ecopilhas é praticada nos “bairros periféricos da cidade”, através de “conjuntos de contentores de grande capacidade instalados na via pública” e “num só local estão disponíveis contentores para a deposição dos resíduos indiferenciados, bem como contentores destinados à separação dos resíduos recicláveis”.

A recolha seletiva porta a porta é realizada “ao domicílio, através de contentores atribuídos aos edifícios” e, desde 2003, também é feita a recolha de papel, cartão e embalagens de plástico, a “funcionar em complementaridade com a rede de vidrões”. O sistema porta a porta “assenta na recolha, em dias alternados, dos diferentes tipos de resíduos” e os horários, “dias de recolha e equipamento de deposição utilizado (contentores, sacos, fardos de papel) podem variar de zona para zona de acordo com a localização” na cidade.

A área ocidental da cidade (que engloba as freguesias de Belém, Ajuda, Campo de Ourique, Estrela, Misericórdia, Santo António, Campolide, Benfica, São Domingos de Benfica e Carnide) tem recolha porta a porta de indiferenciados à terça, quinta-feira e sábados, de embalagens à segunda e sexta-feira e de papel à quarta-feira.

A zona oriental (que integra as freguesias de Santa Maria Maior, São Vicente, Arroios, Penha de França, Beato, Areeiro, Avenidas Novas, Alvalade, Marvila, Olivais, Lumiar, Santa Clara e Parque das Nações) tem recolha de indiferenciados à segunda, quarta e sexta-feira, de embalagens à terça-feira e sábado e de papel à quinta-feira.

FONTE André Campos Ferrão DN.PT

Fonte da Notícia
DN.PT
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