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Nacional

Parlamento diz “sim” à despenalização da eutanásia

O parlamento despenalizou esta quinta-feira, 20 de fevereiro, a morte medicamente assistida.

A Assembleia da República aprovou hoje na generalidade os cinco projetos para despenalização da morte medicamente assistida.

Estas foram as votações dos cinco projetos:

Projeto do Bloco de Esquerda: 124 votos a favor; 14 abstenção, 85 contra.

Projeto do PAN: 121 votos a favor; 16 abstenção, 86 contra.

Projeto do PS: 127 votos a favor; 10 abstenção, 86 contra.

Projeto do PEV: 114 votos a favor; 23 abstenção, 86 contra.

Projeto do IL: 114 votos a favor; 24 abstenção, 85 contra.

O debate sobre os cinco projetos de lei para a despenalização da morte medicamente assistida, na Assembleia da República, durou duas horas e 44 minutos.

A discussão começou às 15:05 e terminou às 17:50, seguindo-se as votações.

A votação nominal, um a um, demorou 30 minutos, a exemplo do que aconteceu na votação de 2018.
Estiveram presentes 222 dos 230 deputados.

O que acontece agora?

Uma vez aprovada na generalidade a despenalização da morte medicamente assistida vai descer à comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos Liberdades e Garantias.

A comissão dos Assuntos Constitucionais encarrega-se do chamado debate na especialidade e os partidos vão tentar chegar a um “texto comum”, resultado de negociações relativamente a textos que não são muito diferentes entre si.

Neste cenário, as semanas e meses que se seguem darão também tempo aos movimentos pró-vida e anti-eutanásia, com o apoio da Igreja Católica, para recolher as assinaturas – são necessárias 60.000 – e propor no parlamento uma iniciativa legislativa de cidadãos para um referendo nacional.

Ultrapassada a fase de discussão na especialidade sem mais surpresas, o texto comum votado em comissão será aprovado em votação final global e seguirá para Belém, tendo o Presidente da República três hipóteses: promulgar, vetar ou enviar a lei para o Tribunal Constitucional (TC).

Se for vetado pelo Presidente, os partidos, em tese, podem ter os deputados necessários para confirmar um eventual diploma – basta, segundo o artigo 136.º da Constituição portuguesa, a maioria absoluta dos deputados em efetividade de funções. Nesse caso, ainda segundo o mesmo artigo, “o Presidente da República deverá promulgar o diploma no prazo de oito dias a contar da sua receção”.

Outra possibilidade é Marcelo Rebelo de Sousa remeter o diploma aos juízes do tribunal das leis.

Nesse caso, se for suscitada a questão constitucional, os prazos decorrem durante semanas até o plenário de juízes anunciar o acórdão.

Constitucionalmente, o “chumbo” de um diploma pelo TC, que depois é vetado obrigatoriamente pelo Presidente e devolvido ao parlamento, pode ser ultrapassado alterando as normas apontadas como inconstitucionais, mas, entre deputados dos vários partidos com projetos de lei ouvidos pela Lusa, esse cenário é visto como o “fim da linha” para a lei para despenalizar a morte medicamente assistida.

O essencial do debate

  • José Manuel Pureza (BE) abriu o debate parlamentar sobre a despenalização da morte assistida, tendo defendido que o Parlamento tem legitimidade para decidir sobre esta matéria, criticando a “utilização cínica e instrumental do referendo” e dos “arautos do medo”. De referir que entre os defensores do referendo estão o CDS e alguns deputados do PSD. “Todos têm direito ao palpite, o que não têm é o direito de fazer com que o seu palpite para que se mantenha na lei a condenação a três anos de prisão ao médico que solidariamente ajudar alguém a antecipar a sua morte”. Para José Manuel Pureza a questão que se cola hoje é se vamos respeitar a decisão de cada um sobre o final da sua vida. O deputado bloquista deu ainda a entender que o BE votará favoravelmente os vários projetos sobre a eutanásia hoje a debate.
  • André Silva (PAN) defendeu que o debate que hoje se realiza é sobre empatia, solidariedade e coragem, nomeadamente a “coragem de criar uma lei justa e rigorosa que respeite a vontade de cada pessoa”. Disse ainda que se trata de um debate sobre justiça e igualdade, questionado se é justo que alguém com mais posses possa valer respeitar a sua vontade fora do país. O deputado do PAN considerou ainda que se trata de um tema que foi amplamente debatido na sociedade portuguesa, defendendo que “estamos hoje em condições de poder escolher com responsabilidade, rigor e coragem”. André Silva criticou os defensores do referendo sobre esta matéria, lembrando que tal não figura em nenhum dos programas dos partidos políticos que se candidataram nas legislativas de outubro. “o medo não nos pode tolher a coragem e impedir de avançar no domínio da consagração de direitos e de cuidar dos mais vulneráveis”, considerou André Silva. Para o PAN, o “sofrimento é uma experiência pessoal e intransmissível, é uma dependência, uma indignidade”, acrescentando que “é agonizante sofrer por saber que depois do sofrimento só há sofrer. “Os cuidados paliativos devem ser garantidos de forma universal, mas isso nada constitua com este debate”, defendeu. 
  • José Luís Ferreira (PEV) salientou que “ninguém é obrigado ou incitado” a acabar antecipadamente com a sua vida. Mas defendeu que a vontade de uma pessoa em situação limite deve ser respeitada. “O Estado não deve proibir a possibilidade de se fazer essa opção [de morte antecipada] em situações limite e com processos muito bem definidos”, defendeu. No entanto, salientou, “esta proposta em nada contribui para desresponsabilizar o Estado de garantir o acesso aos cuidados paliativos e a obrigação de disponibilizar uma boa rede de cuidados continuamos. Da mesma forma, destacou, está previsto o direito de objeção de consciência por parte dos prestadores de cuidados de saúde que não desejem ter parte nos processos de morte medicamente assistida. Por fim, defendeu que este tipo de procedimentos deve ser exclusivo do serviço nacional de saúde — colocando o “negócio” afastado desta matéria — e só possível para pacientes conscientes, capazes e maiores de idade, cuja vontade seja expressa, reiterada, informada, podendo ser revogada em qualquer momento. Os verdes votarão a favor dos cinco projetos a discussão, adiantou ainda. De referir que neste tema Verdes e PCP têm sentido de votos distintos, com os comunistas a serem contra a despenalização da eutanásia.
  • António Filipe (PCP), tomando palavra para defender o voto contra dos comunistas a todos os projetos em discussão para a despenalização da eutanásia, destacou que não se trata de “uma guerra de trincheiras”, de direita ou de esquerda, de iluminados ou obscurantistas, ou sequer de discutir a dignidade individual. No entanto, defendeu, “o país não pode criar mecanismos legais para ajudar a morrer quando não garante condições materiais para continuar a viver”, disse, colocando a tónica sobre a disponibilização de cuidados paliativos universal.
  • O primeiro deputado do PSD a falar foi António Ventura, contra a despenalização da eutanásia. O PSD deu liberdade de voto aos seus deputados, pelo que se farão ouvir vozes sociais-democratas contra e a favor da despenalização da morte medicamente assistida. O deputado defende que “há muito a fazer” em matéria de cuidados paliativos, no investimento no serviço nacional de saúde e na prestação de cuidados a idosos. António Ventura alertou ainda para o risco da “rampa deslizante”. “Com o tempo já estou a ver a possibilidade de alguns reivindicarem eutanásia mais abrangente”, disse, dando como exemplo países como a Holanda ou a Bélgica. O deputado considerou inadmissível que se venha a “sofrer por desistência do Estado” e manifestou receio que a despenalização da eutanásia seja resultado da “demissão do Estado e a capitulação do que falta fazer”.
  • No sentido contrário, o deputado André Coelho Lima, também do PSD, defendeu o voto a favor da despenalização da morte assistida. O deputado defendeu que a questão que hoje se coloca é se a vida é um direito individual ou coletivo e a quem pertence esse direito. “No meu espírito não reside a mínima dúvida que de que vida é um direito de cada um de nós”, disse. Dizendo-se pela vida, pela dignidade e pela autodeterminação, defendeu que não deve ser o Estado a decidir como alguém pode morrer.
  • Mariana Mortágua (BE) defendeu que nenhum deputado pode dizer hoje em consciência que não teve tempo de tomar uma decisão, considerando que o debate sobre esta matéria tem sido intensa pelo menos desde 2018. Para a deputada bloquista, que saudou as palavras de André Coelho Lima, “esta é uma questão de humanidade e compaixão. O que é que há de humano em obrigar alguém a sofrer quando não há nada para além desse sofrimento do que a morte?”. Salientando que esta é uma questão que se sobrepõe a inclinações políticas, Mariana Mortágua defendeu a “vontade de respeitar todos, os que escolhem viver o seu sofrimento até ao fim e os que decidem por um fim sem sofrimento”. A deputada apelou, assim, ao “fim da criminalização de um ato de respeito por quem está em sofrimento”.
  • Telmo Correia (CDS) defendeu, ao tomar a palavra, que o debate sobre a eutanásia não está “amadurecido” na sociedade portuguesa. Lembrando que o CDS é um partido humanista, disse que, “em total liberdade”, se assume que “não há vidas que valham a pena viver e outras que não”. Considerando a eutanásia um “sinistro retrocesso civilizacional”, o deputado deixou algumas questões, sendo elas: como é que se garante a compatibilização entre o sofrimento e uma escolha lúcida? Será que esse sofrimento não condiciona a escolha? Será que a escolha não seria outra se o sofrimento fosse aliviado? Quem avalia a legitimidade da dor? A medicina pode no futuro encontrar soluções, como se compatibiliza isso com pedidos de eutanásia possíveis a partir dos 18 anos. Findas as questões, o deputado criticou que se admita “a eutanásia num país onde falta quase tudo”. Considerando que hoje se faz uma escolha “de vida ou de morte”, disse que o CDS, “como sempre, diz ‘sim’ à vida e votará pela vida”, dando conta desta forma que o partido votará contra os projetos de despenalização da eutanásia em discussão. O CDS apelou ainda a que haja “resistência” perante uma possível aprovação da despenalização da eutanásia, vendo como legítimo um “recurso constitucional” ou a um referendo.
  • André Ventura (Chega), contra a despenalização da morte medicamente assistida, apelou ao Presidente da República aceitar um referendo, pois disse já não ter esperança “de que esta câmara reverta essa decisão [de avançar com a despenalização]. “Se tiverem coragem vamos dar aos portugueses a palavra”, disse.
  • Alexandre Quintanilha (PS) defendeu o projeto socialista para a despenalização da morte medicamente assistida salientando que este “não descriminaliza a eutanásia, mas define sim, de forma rigorosa, as situações em que a ajuda dos profissionais de saúde pode ser solicitada por alguém que queira acabar com o seu sofrimento”. “Foi a vontade de outros que nascemos, que não aconteça o mesmo com o nosso projeto de vida e morte”, concluiu. De referir que o PS conferiu aos seus deputados a liberdade de voto.
  • Sofia Matos (PSD), a favor da despenalização da eutanásia, começou congratular a liberdade de voto do PSD e salientou que os diplomas hoje em discussão “oferecem segurança e preveem as circunstâncias de quem e quando pode recorrer” à morte medicamente assistida. A deputada salientou que se trata de uma decisão apenas possível para maiores de idade, conscientes, capazes de decidir, que sofrem de uma doença sem cura, irreversível e fatal. Além disso, destacou, esta decisão passará por vários estágios de avaliação médica e psicológica. “A regulamentação da eutanásia não pode significar desinvestimento nas redes de cuidados paliativos e é intolerável admitir com a eutanásia desresponsabilizar o Estado das suas funções sociais”. Ainda assim, salientou, “não posso deixar de escolher para estas pessoas o que escolho para mim: poder escolher”, concluiu.
  • Opondo-se a despenalização da eutanásia, Cláudia Bento (PSD) salientou que “não é aceitável colocar a eutanásia como solução terapêutica”, alertando para o risco de se deteriorar a relação médico-paciente, com o doente a questionar se está a receber os cuidados necessários quando tratado por um médico que pratica a eutanásia. A deputada alertou ainda para aquele que foi batizado como “fenómeno da rampa deslizante”, recorrendo aos exemplos da Bélgica e da Holanda, salientando que “ao longo do tempo as pretensas salvaguardas [da lei] foram-se apagando, passando de situações de alcance limitado para algo mais abrangente”. Tal como Telmo Correia (CDS), a deputada levantou várias questões, entre elas o risco de “coação moral” sobre os mais fracos para recorrer à eutanásia, assim como questionou a preparação do Serviço Nacional de Saúde para assumir a prática deste ato.
  • Maria Almeida Santos (PS) salientou que o debate que hoje tem lugar não visa “instrumentalizar a vida. Trata-se de legislar condições em que um pedido de eutanásia não é punível”. “Hoje alguns doentes vivem perante uma incógnita. Há médicos que ajudam, há médicos que querem ajudar, mas temem a penalização porque não há quadro legal que os projeta e há médicos que serão sempre objetores de consciência”.
  • Bebiana Cunha (PAN) defendeu que “a vontade do doente tem de ser tida em conta quando este manifestar de forma consciente e esclarecida conformar a sua vida de acordo com as suas próprias conceções”. Questionando a quem cabe a decisão sobre o fim da vida, concluiu que a mesma “só pode caber às pessoas que infelizmente estão nesta situação”.
  • Pedro Filipe Soares (BE), com a intervenção final neste debate, reiterou que a eutanásia é um tema amplamente discutido na nossa sociedade. “Do nosso ponto de vista todas e todos temos a obrigação de decidir com essa consciência”, disse o deputado bloquista. “Sabemos bem que a ciência tem limites, não consegue responder a toda a dor, a todo o sofrimento”, lembrou o deputado, criticando ainda a “chantagem” do argumento da “rampa deslizante”, lembrando que o mesmo foi dito quando se aprovaram leis relativamente à toxicodependência ou a despenalização do abordo. Mais acrescentou que se aprendeu com “as insuficiências de países que já permitem a despenalização da morte assistida”, sem que isso valide um Estado opressor da liberdade.

As primeiras reações à despenalização

Já foram vários os deputados a reagir à aprovação da despenalização da eutanásia nas redes sociais, entre os quais Pedro Filipe Soares, Joana MortáguaMoisés Ferreira, Tiago Barbosa Ribeiro, Marisa Matias, Joana Mortágua e Catarina Martins (que partilharam ambas uma fotografia com João Semedo).

 

FONTE 24.sapo.pt

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Fonte
24.SAPO.PT
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